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Os Lusíadas, de Luís de Camões: Análise e resumo

Nesse grande poema épico, os feitos dos navegadores portugueses em direção às Índias são igualados às façanhas de heróis da Antiguidade greco-latina

Por da redação
Atualizado em 4 jun 2018, 18h42 - Publicado em 10 jun 2015, 18h32
 (thomaguery/iStock)
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Os Lusíadas, grande poema épico de Luís de Camões, foi publicado em 1572, durante o Renascimento em Portugal. Nesse período, os autores buscavam sua inspiração na cultura da Antiguidade greco-latina. Eneida, de Virgílio, que narra a fundação de Roma e outros feitos heróicos de Enéias, e a Odisséia, de Homero, que conta as aventuras do astucioso Ulisses, foram certamente as maiores influências de Camões.

Em dez cantos, subdivididos em estrofes de oito versos, Os Lusíadas trata das viagens dos portugueses por “mares nunca dantes navegados”. Uma das características da épica é a narração de episódios históricos ou lendários de heróis que possuem qualidade superior.

EM CÂMERA LENTA
As proporções dessa obra e a linguagem arcaica podem, de início, afastar o leitor de hoje. As principais dificuldades encontradas na leitura são os termos antigos utilizados, a sintaxe truncada e o grande número de informações mitológicas e históricas. Mas é possível compreender os principais elementos, porque o poema épico tem como finalidade narrar a própria história, ou feitos heróicos que estão no terreno da mitologia. As descrições são minuciosas, abrangendo todos os detalhes da paisagem, as cenas de batalha e as vestes dos guerreiros.

A épica, como gênero, diferencia- se da tragédia. Na tragédia – como na de Édipo –, o personagem principal envolve-se em uma trama que acabará por aniquilá-lo. O espectador assiste, aflito, ao trágico encontro do protagonista com seu destino inevitável e cruel: Édipo fura os próprios olhos, perambulando sem destino. No gênero épico, o “elemento de tensão” desaparece e surge em seu lugar o “elemento retardador”. Os personagens épicos não têm um desenvolvimento psicológico elaborado. Eles seguem suas características básicas, que não mudam no decorrer da história. A épica deve ser lida, portanto, de maneira tranqüila e minuciosa, como uma aventura que se passa em câmera lenta.

FORMA
O poema é constituído por 1.102 estrofes de oito versos cada uma, o que resulta em um total de 8.816 versos. Camões utilizou em sua obra somente versos decassílabos, ou seja, de dez sílabas métricas. Esse tipo de verso era conhecido como “medida nova” e foi levado da Itália para Portugal por Sá de Miranda, em 1527, fato que marca o início do classicismo português.

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As rimas aparecem da seguinte forma: o primeiro verso rima com o terceiro e o quinto; o segundo verso rima com o quarto e o sexto; e o sétimo e o oitavo rimam entre si (o que é representado pelo esquema ABABABCC). Essas estrofes são chamadas de oitava-rima. Além disso, o poeta inseriu na obra diversas rimas internas, o que causa efeitos de assonância (sonoridade das vogais) e aliteração (sonoridade das consoantes).

ESTRUTURA

Assim como a Odisséia, de Homero, o poema de Camões é composto de cinco partes: Proposição, Invocação, Dedicatória, Narração e Epílogo. Na Proposição — que aparece no Canto I, da primeira à terceira estrofe —, o autor nos apresenta o tema de seu poema: a viagem de Vasco da Gama às Índias e as glórias do povo português, comandado por seus reis, que espalharam a fé cristã pelo mundo.
A segunda parte – também no Canto I, quarta e quinta estrofes – consiste na invocação das musas do rio Tejo, as Tágides. Essa é mais uma indicação de que Camões retirou seu modelo da cultura greco-latina.

Para os gregos, o poeta era um instrumento de uma força superior. Na Dedicatória — Canto I, da estrofe 6 à 17 —, o poeta, após inúmeros elogios, dedica a obra ao rei dom Sebastião, a quem confia a continuação das glórias e conquistas que serão narradas em seguida. Na Narração, o poema propriamente se desenvolve — do Canto I, estrofe 18, ao Canto X, estrofe 144. Nela, é contada a navegação de Vasco da Gama às Índias e as glórias da história heróica de Portugal.

O Epílogo – Canto X, estrofes 145 a 156 – consiste num lamento do poeta, que, ao deparar com a dura realidade do reino português, já não vê muitas glórias no futuro de seu povo e se ressente de que sua “voz enrouquecida” não seja escutada com mais atenção.

ENREDO
Como era comum na literatura épica, a narração de Os Lusíadas começa in media res – ou seja, em plena ação – no caminho, quando os portugueses já deixaram sua terra natal e se encontram ancorados em Melinde, cidade situada no oceano Índico.

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Enquanto isso, os deuses fazem uma primeira reunião para decidir o destino dos navegantes. Baco se opõe ao feito, que diminuirá sua glória como senhor do Oriente.

No entanto, Vênus, deusa do amor, e Marte, deus da guerra, colocam-se a favor dos portugueses. Júpiter concorda com os dois. Mercúrio, o mensageiro, é enviado para garantir que o povo selvagem de Melinde seja hospitaleiro com os portugueses.

O capitão do navio, Vasco da Gama, narra ao rei de Melinde a história de Portugal, em que se inserem as figuras de grandes heróis da história portuguesa e os episódios de Inês de Castro, do Velho do Restelo e do Gigante Adamastor.

A caravela continua sua viagem, atravessando o oceano Índico. Nessa parte da trajetória, um dos tripulantes, o marinheiro Veloso, narra a seus companheiros o episódio dos Doze de Inglaterra, espécie de novela de cavalaria em que 12 cavaleiros portugueses vão à Inglaterra para defender a honra de damas que haviam sido ofendidas por 12 cavaleiros ingleses. Após uma luta sangrenta, os heróis lusitanos vencem os ingleses, aos quais sobra a morte ou a vergonha da derrota.

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Ao mesmo tempo, o deus dos oceanos, Netuno, recebe a visita de Baco, que o convence a aliar-se contra os portugueses, argumentando que depois daquela viagem os homens iriam perder o temor dos mares. Toda a força dos ventos invocados por Netuno atinge a embarcação de Vasco da Gama. Sob a proteção de Vênus e das Nereidas, as ninfas marinhas, os portugueses sobrevivem, mas seu navio sofre inúmeras avarias, chegando a Calecute, na Índia, graças a correntes marítimas invocadas em seu auxílio, uma vez que o mastro da embarcação estava partido.

Em Calecute, os portugueses são envolvidos em mais uma trama de Baco, que havia induzido o Samorim (líder local) a separar Vasco da Gama de seus companheiros e prendê-lo. O capitão consegue escapar mediante o pagamento de suborno, o que vale uma crítica do narrador à corrupção dos homens pelo dinheiro.

A última aventura dos argonautas portugueses é sua visita à Ilha dos Amores, já no retorno a Portugal. Vênus prepara maravilhosas surpresas para os visitantes.

Na ilha, estão ninfas que foram flechadas por cupido. Ao avistarem os navegantes, elas imediatamente ficam apaixonadas. Começa, então, uma verdadeira perseguição erótica, em que são exaltadas as qualidades do amante português. Depois de um banquete no qual todos ouvem previsões sobre o futuro de cada um, a deusa Vênus mostra a Vasco da Gama uma esfera, mágica e perfeita: a maravilhosa Máquina do Mundo.

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Após a volta tranqüila dos aventureiros a Portugal, o poeta termina seu livro em tom de lamento. Queixa-se de que sua opinião não seja levada em conta pela “gente surda e endurecida” e oferece ao rei dom Sebastião uma solução para impedir a decadência do Império: uma grande empresa em direção ao Oriente, buscando a salvação de muitos infiéis e resgatando a glória do heróico povo português.

TRÊS EPISÓDIOS

Existem três episódios em Os Lusíadas que merecem destaque por sua importância: o de Inês de Castro, o do Velho do Restelo e o do Gigante Adamastor.

O episódio de Inês de Castro aparece no Canto III, durante o relato de Vasco da Gama ao governante de Melinde. Trata-se da história do amor proibido de Inês, dama de companhia da rainha, pelo príncipe dom Pedro. Ao saber do envolvimento do príncipe com ela e preocupado com a ameaça política oferecida por Inês, que tinha parentesco com a nobreza de Castela, o rei dom Afonso manda executar a jovem.

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O rei percebe então que o amor de Inês por seu filho era sincero e decide mantê-la viva, mas o povo, representando o interesse do Estado, o obriga a executar a moça. Dom Pedro, ausente do reino na ocasião do assassinato, inicia depois uma vingança sangrenta contra os executores e coroa o cadáver de Inês, aquela “que depois de ser morta foi rainha”.

O relato sobre o Velho do Restelo encontra-se no Canto IV. Na praia lisboeta de Restelo, um velho profere um discurso poderoso contra as empresas marítimas de Portugal, que ele considera uma ofensa aos princípios cristãos, uma vez que a busca de fama e glória em terras distantes contraria a vida de privações pregada pela doutrina católica.

O episódio do Gigante Adamastor figura no Canto V. Ele aparece quando Vasco da Gama e sua tripulação se dirigem ao Cabo das Tormentas, ou Cabo da Boa Esperança, personificado pela figura de Adamastor. Esse gigante da mitologia grega se apaixonara pela ninfa Tétis, que o rejeitara.  Peleu, o marido de Tétis, transformou então o gigante em pedra. Mais uma história de Camões em que o amor, “áspero e tirano”, causa o infortúnio a quem se deixa levar por ele.

TRECHO COMENTADO

“Vês aqui a grande máquina do mundo,
Etérea e elemental, que fabricada
Assim foi do Saber alto e profundo,
Que é sem princípio e meta limitada.
Quem cerca em derredor este rotundo
Globo e sua superfície tão limada,
É Deus: mas o que é Deus ninguém o
entende,
Que a tanto o engenho humano não se
estende.”
(Canto X, estrofe 80)

Comentário
Nessa estrofe, a deusa Vênus apresenta aos portugueses a máquina do mundo, uma esfera perfeita, espécie de maquete do universo, na qual está contido tudo o que nele existe. As mentes mortais logo perguntam: se nessa esfera está tudo o que há, então o que está por fora dela? A deusa responde que, em volta do globo, está Deus. Alguém poderia perguntar: e o que está além de Deus? Mas logo somos advertidos de que o entendimento de Deus está além da compreensão humana; não devemos, portanto, insistir na questão. Camões adota em seu livro a concepção de Ptolomeu, segundo a qual a Terra ocuparia o centro do universo, sendo envolvida por sete esferas celestes, como as camadas de uma cebola, cada uma correspondendo a um dos sete planetas então conhecidos. O paraíso celeste, ou empíreo, estaria localizado na sétima esfera, a mais luminosa e próxima de Deus.

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