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Urbanização: O destino do nosso lixo

Urbanização: O destino do nosso lixo
ENTULHO – Os aterros sanitários são os locais adequados para o descarte do lixo, como este em Caieiras (SP) ()

Regulamentação para erradicar os lixões no Brasil fracassa, agravando os problemas ambientais decorrentes do acúmulo de resíduos em áreas impróprias

O dia 2 de agosto de 2014 poderia ter sido um marco ambiental no Brasil. Nessa data, todas as prefeituras do Brasil deveriam ter erradicado os lixões a céu aberto e passado a depositar o lixo em aterros sanitários. Era o que determinava a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), uma lei instituída pelo governo federal em agosto de 2010 para regulamentar a gestão do lixo nas cidades. Os municípios que não cumprissem a meta poderiam responder por crime ambiental e estariam sujeitos a multas de até 50 milhões de reais.

No entanto, sete anos depois que a lei foi sancionada, 3.334 municípios de um total de 5.570, ainda despejam resíduos em áreas impróprias – ou seja, 60% das prefeituras não conseguiram cumprir a determinação. Dessa forma, 41,5% dos resíduos sólidos coletados ainda vão parar em lixões.

Uma das razões alegadas para que a maioria dos municípios não conseguisse cumprir a meta de erradicação dos lixões é que a maioria das prefeituras não dispõe de capacidade técnica instalada e arrecadação suficientes para cumprir a lei, principalmente aquelas com menos de 10 mil habitantes nas regiões Norte e Nordeste.

Restou ao governo postergar a implantação da lei. O Ministério do Meio Ambiente iniciou um processo de revisão do PNRS para discutir novas metas e os recursos necessários para a implantação do plano. Um projeto de lei, já provado pelo Senado e aguardando votação na Câmara dos Deputados, pode estender até 2021 o prazo para a erradicação dos lixões. Ainda assim, o cumprimento dessa meta é visto como irreal por muitos especialistas da área.

Urbanização: O destino do nosso lixo
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A GERAÇÃO DE LIXO

O descarte adequado do lixo é um dos principais desafios urbanos que as cidades enfrentam atualmente. No mundo, as 7 bilhões de pessoas que habitam o planeta produzem 1,4 bilhão de toneladas de resíduos sólidos por dia – algo em torno de 1,2 quilo per capita por dia. Nos últimos 30 anos, a produção de lixo cresceu três vezes mais rápido que o número de habitantes.

No Brasil, cada pessoa gerou pouco mais de 1 quilo de lixo por dia. Esse número também está em elevação. Mesmo com a crise que fez o Produto Interno Bruto (PIB) retrair 3,8% de 2014 para 2015, o total do lixo gerado no país no período aumentou 1,7%, saltando de 78,6 milhões de toneladas para 79,9 milhões de toneladas.

RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA

O aumento na geração do lixo é atribuído ao modelo de consumo que cada vez mais inclui um grande volume de materiais descartáveis. O avanço do problema nas últimas décadas levou o governo federal a propor uma lei específica para lidar com o desafio do lixo nas cidades. Quando foi instituída em 2010, a PNRS foi saudada como um importante avanço da gestão ambiental. A lei previa um conjunto de instrumentos para estimular a reciclagem e a reutilização dos resíduos sólidos que têm valor econômico e podem ser reciclados ou reaproveitados.

Um dos pilares dessa iniciativa é a adoção da chamada responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. Por essa lógica, toda a sociedade seria responsável por diminuir o volume de resíduos sólidos e rejeitos e o seu posterior reaproveitamento – do produtor, passando pelo comerciante até o consumidor final. Poder público, empresas e cidadãos seriam corresponsáveis pela gestão do lixo.

Um importante instrumento dessa política é a logística reversa, incorporada à legislação. Ela estabelece formas de viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos e embalagens para as empresas, de modo que elas possam reaproveitar o material em seus ciclos de produção ou dar ao lixo o destino mais ambientalmente adequado. Isso significa que a responsabilidade do fabricante não termina com a venda do produto: a empresa deve prever como o material poderá ser devolvido ao final do seu ciclo de vida e de que forma ele pode ser reciclado ou descartado.

No Brasil, quase 70% dos municípios possuem alguma iniciativa de coleta seletiva de lixo. Apesar disso, os índices de reciclagem não avançaram como se esperava. Especialistas apontam a falta de uma política mais efetiva de incentivo ao consumidor, que muitas vezes joga todo o lixo em recipiente comum sem separação. Além disso, faltam locais aptos para receber e tratar esses resíduos. Como resultado, em alguns setores, como o de embalagens PETs, houve até mesmo redução do total reciclado de 13% entre 2014 e 2015.

LIXÕES E ATERROS SANITÁRIOS

A PNRS também estabelecia ações para a destinação adequada dos rejeitos sólidos que não podem ser reciclados ou reutilizados, como o lixo orgânico. É aí que entra a proposta de erradicação dos lixões e a utilização dos aterros sanitários como destino final dos resíduos.

LIXÕES: Nos lixões, os resíduos são depositados em aterros a céu aberto sem nenhum controle ambiental ou tratamento. Além de produzir o gás natural metano (CH4), um dos agravadores do efeito estufa, a decomposição da matéria orgânica gera o caldo chorume, altamente poluente. Como o terreno dos lixões não é impermeabilizado, o chorume se infiltra no solo e contamina o lençol freático, com efeitos nocivos sobre a água, a fora e a fauna e comprometimento da saúde pública. Segundo os dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), por ano, 30 milhões de toneladas de rejeitos vão parar nos lixões sem qualquer tratamento.

O problema também ganha contornos econômicos e sociais, pois muitas pessoas tiram seu sustento desses locais insalubres, recolhendo o lixo para reaproveitar os materiais, sujeitando-se a contaminação e doenças. Um dos lixões mais emblemáticos em atividade no Brasil é o aterro de Gramacho, em Duque de Caxias (RJ), considerado o maior da América Latina. Ele foi desativado em 2012, mas o lixo ainda é despejado ali de forma clandestina e muitas famílias continuam a viver do material descarregado.

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VIA SUJA – Em Beirute, capital do Líbano, sacos de lixo ocupam toda a extensão da rua ()

O DESAFIO DO LIXO TECNOLÓGICO

Celulares, computadores, aparelhos de TV e equipamentos eletroeletrônicos de modo geral ficam velhos, obsoletos e são descartados. E o que fazer com todo esse lixo eletrônico, ou e-lixo, como também é chamado?

O que complica a destinação correta e a reciclagem desse material é a sua complexidade. Em cada aparelho há centenas de componentes e uma infinidade de materiais. o problema vai além da simples disposição do plástico, vidro e metais deles, que demoram séculos para se decompor na natureza. os equipamentos contêm substâncias perigosas, como mercúrio, cádmio, chumbo, zinco e manganês, capazes de penetrar no solo e contaminar a água, além de emitir gases poluentes.

Em 2017, o volume desses aparelhos jogados fora em todo o planeta deve ser da ordem de 50 milhões de toneladas. no brasil, embora não haja estatísticas oficiais, estima-se que seja descartado algo como 1,2 a 1,4 milhão de toneladas de lixo eletrônico por ano. No entanto, somente 724 das mais de 5.500 cidades brasileiras têm algum tipo de coleta específica desse material.

Devido ao alto custo de reciclagem do lixo eletrônico, os países mais ricos preferem exportar o material para as ações mais pobres do que tentar reaproveitá-lo. dessa forma, computadores velhos, celulares antigos e outros equipamentos eletrônicos dos Estados unidos e de nações europeias vão parar em nações como China, Índia, Nigéria e Gana.

Quando chegam a esses países, parte do material é enviada para fábricas informais de reciclagem. Em outros casos, vão parar em lixões. Esses lugares são revirados por pessoas que buscam seu sustento extraindo cobre, alumínio e ferro de toda essa sucata, mesmo estando sujeito à exposição tóxica das substâncias presentes nos componentes eletrônicos.

ATERROS SANITÁRIOS: A PNRS determinou que os municípios substituíssem os lixões por aterros sanitários, considerados o destino mais adequado para o lixo urbano. Trata-se de áreas nas quais os resíduos são compactados e cobertos por terra. Terrenos assim têm sistema de drenagem que captam líquidos e gases resultantes da decomposição dos resíduos orgânicos. Dessa forma, o solo e o lençol freático ficam protegidos da contaminação do chorume, e o metano é coletado para armazenagem e queima.

ATERROS CONTROLADOS: É uma categoria intermediária entre os aterros sanitários e os lixões. Nos aterros controlados, o lixo recebe uma cobertura de terra para minimizar o cheiro e a proliferação de insetos e animais. No entanto, o solo não é impermeabilizado adequadamente e não há sistema para tratamento do chorume.

SANEAMENTO BÁSICO

Outro grave problema enfrentado pelas cidades brasileiras é a falta de serviços de coleta e tratamento de esgoto. Dez anos após a Lei de Saneamento Básico que prevê a universalização dos serviços até 2030, 34,7% dos domicílios continuam sem acesso à rede coletora de esgoto. As melhorias no sistema ocorreram nas áreas mais urbanizadas das cidades, ficando para trás o atendimento de água e esgoto nas zonas rurais, nas periferias e nos domicílios estabelecidos em áreas irregulares, onde a população já sofre com a falta de infraestrutura e serviços essenciais.

Os dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), referentes a 2015, mostram que mais de 100 milhões de pessoas utilizam fossas ou jogam seus dejetos diretamente nos rios sem tratamento, contribuindo para a poluição e a exposição a doenças. Despejar esgotos não tratados pode poluir o solo, lençóis freáticos e reduzir a quantidade de água potável disponível. Quanto ao acesso à água tratada, houve um avanço importante, e hoje 83% da população tem acesso à rede. Mesmo assim, em números absolutos, ainda representa um desafio, pois mais de 35 milhões de brasileiros não têm serviço de água tratada.

Todos esses índices colocam o Brasil em 11º lugar no ranking latino-americano de saneamento, atrás de países como Peru, Bolívia e Uruguai. Estudo recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre o andamento de obras do setor mostrou que, no atual ritmo, a universalização dos serviços só chegará a todos os brasileiros após 2050, ou seja, mais de 20 anos depois do prazo previsto no plano oficial do governo federal.

Urbanização: O destino do nosso lixo

RESUMO – URBANIZAÇÃO

Problema do lixo: A grande produção de resíduos obriga os governos a adotar soluções caras para armazenar esse material. Se isso não for feito de maneira adequada, o lixo contamina a água e os ecossistemas, compromete a saúde pública e contribui para as enchentes. O Brasil gera quase 80 milhões de toneladas de rejeitos porano. Cerca de 40% vai parar nos lixões sem qualquer tratamento.

LEI DE RESÍDUOS SÓLIDOS:  A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), sancionada em 2010, determinava que, a partir de 2014, todos os municípios brasileiros deveriam substituir os lixões por aterros sanitários. No entanto, sete anos depois que a lei foi sancionada, 3.334 municípios, de um total de 5.570, despejam resíduos em lixões. Um projeto de lei tramita no Congresso para estender até 2021 o prazo para a erradicação dos lixões.

LIXÕES: Nos lixões, a decomposição da matéria orgânica a céu aberto gera o caldo chorume, altamente poluente. Como o terreno dos lixões não é impermeabilizado, o chorume se infiltra no solo e contamina o lençol freático.  Muitas pessoas recolhem produtos descartados nos lixões como forma de ganhar dinheiro, ficando expostos a  contaminação e doenças.

RECICLAGEM: A PNRS estabelece a responsabilidade compartilhada entre consumidor,  comércio, fabricantes e importadores para dar um destino final adequado para determinados produtos. Latas de alumínio, potes de vidro, garrafas PET e plásticos devem ser separados do lixo orgânico para que a matéria-prima seja novamente usada pela indústria. Para que ocorra, o lixo deve ser descartado de forma seletiva e entregue em locais determinados.

SANEAMENTO BÁSICO: No Brasil, metade da população não tem acesso à coleta de esgoto e despeja esse material em fossas ou diretamente nos rios. Apenas 42,7% dos domicílios estão ligados a estações de tratamento de esgoto. A falta de saneamento contribui para a poluição, contaminação da água e exposição a doenças.

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Urbanização: O destino do nosso lixo
Regulamentação para erradicar os lixões no Brasil fracassa, agravando os problemas ambientais decorrentes do acúmulo de resíduos em áreas impróprias O dia 2 de agosto de 2014 poderia ter sido um marco ambiental no Brasil. Nessa data, todas as prefeituras do Brasil deveriam ter erradicado os lixões a céu aberto e passado a depositar o lixo em aterros sanitários. Era […]

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