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Desastre em Mariana (MG): As questões levantadas e as consequências do rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana (MG)

Screenshot_25               Devastação O distrito de Bento Rodrigues (MG) ficou coberto com a lama liberada após o rompimento da barragem

A lama e seu rastro de destruição

O rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana levanta questões urgentes sobre como os crimes ambientais são punidos

 

            Os ponteiros do relógio se aproximavam das 16 horas do dia 5 de novembro de 2015, uma quinta-feira, quando ocorreu a maior tragédia ambiental no Brasil e o maior desastre relacionado à mineração no mundo. O rompimento da barragem do Fundão, na zona rural do município de Mariana (MG), liberou uma enxurrada de rejeitos de minério de ferro. O “tsunami de lama” atingiu nove cidades, percorrendo o Rio Doce até chegar ao litoral do Espírito Santo, a mais de 600 quilômetros de distância. A região mais afetada foi o distrito de Bento Rodrigues, onde ao menos 17 pessoas morreram – outras duas ainda estão desaparecidas.
            De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a barragem do Fundão continha pelo menos 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos de ferro. A quantidade equivale a mais ou menos 10 vezes o tamanho da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro.
A responsável pela barragem é a Samarco, empresa estabelecida em Mariana há 38 anos e que é controlada por duas gigantes da mineração: a brasileira Vale, que é a maior exportadora de minério de ferro, e a anglo-australiana BHP Billiton, maior multinacional do setor. Segundo a consultoria norte-americana de gestão de riscos Bowker Associates, os prejuízos financeiros são estimados em 5,2 bilhões de dólares. O cálculo leva em conta os gastos para reconstrução das áreas afetadas, descontaminação do solo e dos rios, além da perda dos bens dos moradores atingidos, impostos e royalties que deixarão de ser pagos pela Samarco a Minas Gerais.

            Os efeitos da tragédia

            Além das mortes e das centenas de pessoas que foram desalojadas, a tragédia deixou um rastro de danos ambientais, econômicos e sociais difíceis de serem dimensionados. Em todo o trajeto da lama, o Ibama detectou a destruição de estruturas públicas, de áreas agrícolas e de preservação permanente de vegetação da Mata Atlântica. O laudo preliminar do Ibama diz, ainda, que o nível de impacto foi tão profundo que é impossível estimar um retorno à normalidade da fauna e da flora nos locais atingidos. A lama também afetou o Rio Doce e alguns de seus afluentes de diferentes formas, provocando assoreamento (excesso de sedimentos no leito), mudanças de curso, diminuição de profundidade e até mesmo soterramento de nascentes.
            A maioria das comunidades presentes nas regiões atingidas dependem economicamente da pesca, da agricultura, do turismo e da mineração. Essas atividades foram impactadas em maior ou menor grau pela catástrofe, o que gerou uma série de dificuldades financeiras e sociais. A Samarco foi obrigada pelo Ministério Público de Minas Gerais a providenciar lar temporário para mais de 260 famílias desabrigadas e a pagar para elas uma indenização de R$ 20 mil, além de um salário mínimo, mais 20% por dependente e uma cesta básica. Também foram determinados pela Justiça acertos no valor de R$ 100 mil para as famílias daqueles que morreram ou ainda estão desaparecidos. Esse montante é considerado um adiantamento, pois o total da indenização ainda será estipulado.

           

            A culpa é de quem?

            A Samarco teve de arcar com esses pagamentos porque é considerada responsável pelo rompimento da barragem de Fundão e por suas consequências ambientais, sociais e econômicas. Logo após o incidente, o Ministério Público de Minas Gerais abriu um inquérito para investigar detalhadamente as causas e se a empresa operava de modo ilegal. Mas, desde o primeiro momento, declarou que a Samarco agiu de maneira negligente, o que teria acarretado o desastre. Alguns indícios corroboram a tese de que a mineradora foi omissa em questões de segurança – e não só ela, mas também órgãos do governo.
            Em duas situações, pelo menos, fica clara a negligência do poder público e sua responsabilidade no acidente.
O processo de construção da barragem do Fundão começou de forma irregular, em 2007, quando a Samarco pediu licença prévia para operar a barragem sem apresentar um projeto executivo, no qual deveriam constar informações completas sobre as intervenções que a obra causaria em seu entorno. Mesmo assim, obteve liberação através da Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais. Em 2013, a mineradora pediu um novo licenciamento. Um laudo técnico encomendado pelo Ministério Público apontou um risco de colapso estrutural, mas, novamente, a empresa foi liberada pelo poder público para operar.
            Entre maio de 2015 e o desastre, a Samarco estava fazendo duas obras de alta complexidade no Fundão. Uma para elevar a altura da barragem, chamada alteamento, outra para fundir a barragem com outra maior, a de Germano. O MP apura se houve abalo estrutural por conta das obras, como também investiga se procede a denúncia de que a Samarco depositava mais lama no reservatório de Fundão do que divulgava e seria seguro. Segundo o engenheiro que projetou a barragem, a empresa depositava uma proporção de 40% de lama para 60% de rejeito arenoso, quando as medidas informadas em seus relatórios eram de 30% e 70%, respectivamente. A maior quantidade de líquidos poderia comprometer a estabilidade da barragem.

Dias após o rompimento de Fundão, a licença da Samarco para operar no complexo de Germano foi embargada.

           

            Medidas punitivas

            O Ibama aplicou na empresa cinco multas, que somam R$ 250 milhões de reais, devido aos estragos ambientais – a mineradora recorre, e as penalidades ainda não foram quitadas. Em acordo firmado em março entre o governo federal e a Samarco, a empresa se comprometeu a fazer um aporte de 4,4 bilhões de reais nos próximos três anos para reparar os danos provocados pelo desastre.
            Além das indenizações, os envolvidos podem responder criminalmente pelo desastre. A Polícia Federal indiciou por crimes ambientais a Samarco, a Vale e a empresa VogBR (consultoria que atestou a estabilidade da barragem) – sete executivos e técnicos tiveram a prisão decretada em fevereiro. No entanto, a julgar pela maneira como o Brasil pune responsáveis por crimes ambientais do gênero, não são poucas as chances de os responsáveis saírem ilesos desses processos.
            Em 2001, ocorreu o rompimento de um reservatório de rejeitos da Mineração Rio Verde, na região de Macacos, área metropolitana de Belo Horizonte. O Ministério Público levou 17 meses para investigar o incidente e depois pediu a condenação de quatro pessoas e da própria mineradora. Passados 15 anos, ninguém foi preso, e a mineradora conseguiu abrandar o valor de multas e indenizações através de acordos com o Tribunal de Justiça.
            Em 2003, uma barragem se rompeu na cidade de Cataguases (MG), espalhando 900 mil metros cúbicos de licor negro, material orgânico constituído de lignina e sódio, na Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul. Até hoje, a empresa responsável pela barragem luta na Justiça para não pagar a multa que recebeu, no valor de R$ 50 milhões.
Em muitos países, as sanções a crimes ambientais costumam ser mais severas. A British Petroleum, responsabilizada pelo vazamento de petróleo no Golfo do México, em 2010, foi obrigada a pagar 20 bilhões de dólares para custear reparos do meio ambiente e indenizações – quantia recorde para sanções ambientais.

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Após o desastre em Mariana, o Novo Código de Mineração voltou a ser discutido no Congresso Nacional

            Legislações para o setor

            O Brasil tem uma legislação específica para o uso de barragens, que está em vigor desde 2010. Embora esteja dentro dos padrões internacionais, a Política Nacional de Segurança de Barragens é recente e ainda não está totalmente regulamentada, o que gera, entre outros problemas, negligência de órgãos fiscalizadores. A última vez que a barragem do Fundão recebeu a visita de um técnico do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão federal responsável pela fiscalização do setor, foi em 2012. Depois disso, a barragem passou por obras significativas, como a de alteamento, e não foi monitorada. Uma semana após o rompimento em Mariana, o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, disse que em 2015 o DNPM só utilizou 13,2% do valor previsto para o programa de fiscalização das atividades mineradoras. A justificativa para o baixo investimento foi o corte de gastos.
            O rompimento da barragem de Fundão reacendeu a discussão sobre o Novo Código de Mineração, que está tramitando no Congresso Nacional desde junho de 2013. O projeto de lei em discussão coloca em lados opostos os parlamentares ambientalistas e os que de alguma forma defendem os interesses das mineradoras.
            O texto inicial do projeto, cujo relator é o deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), priorizava o âmbito econômico da exploração mineral em detrimento de garantias ambientais básicas. Entre as propostas, havia uma para a liberação de parte da área de Unidades de Conservação (territórios ecologicamente relevantes protegidos por lei) para a atividade mineradora. Depois do impacto da catástrofe em Mariana, Quintão participou de reuniões com procuradores federais e parlamentares para alterar o texto e torná-lo mais adequado perante os riscos que a atividade traz para o meio ambiente. Foram feitas 28 emendas e ainda não há data para a nova versão do projeto ser votada.

            Dependência da mineração

            O desastre em Mariana evidencia um grande paradoxo do estado de Minas Gerais. Ao mesmo tempo que precisa combater os riscos da mineração, tem uma economia que depende excessivamente da atividade. Um exemplo disso é o próprio município de Mariana, em que 80% da arrecadação vinha da mineração antes do desastre. Desde 2012, quando se iniciou uma crise internacional no setor de mineração, autoridades de planejamento vêm falando sobre a importância de investir em outros setores, como alta tecnologia e indústria aeromobilística.
            Como em outras regiões do país, o desafio é crescer sustentavelmente, ou seja, com ganhos econômicos efetivos, preservando o meio ambiente e a segurança da população. O rompimento de Fundão e suas graves consequências têm muito a ensinar sobre o tema – pena que às custas de vidas perdidas e danos ambientais irreversíveis.

            Rejeito inerte ou lama tóxica?

            Como se não bastasse ter de lidar com a destruição de seus lares, os moradores das regiões afetadas pelo rompimento da barragem da Samarco temem que o contato com os rejeitos da mineração provoque algum dano à saúde.
            No dia seguinte ao rompimento da barragem de Fundão, a Samarco informou que o rejeito liberado era inerte, composto em sua maior parte de sílica (areia), e que não apresentaria nenhum elemento químico danoso à saúde. No entanto, um laudo do SAAE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) de Baixo Guandu (ES) atestou a presença de metais pesados, como arsênio, chumbo, cromo, zinco, bário e manganês, entre outros, em níveis superiores ao recomendável. Dias depois, a ONU soltou um comunicado oficial redigido por ambientalistas alertando sobre a toxicidade dos rejeitos.
            A Samarco afirmou que, embora haja a presença de metais como ferro e manganês acima dos valores de referência, os rejeitos não representam riscos à saúde. Por enquanto, o que se sabe é que a lama é tóxica, ainda que não ofereça ameaça real à população. No entanto, ambientalistas investigam se os efeitos do contato com tais substâncias podem demorar a aparecer.

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Mineradoras doaram R$ 6,6 mi a deputados que debatem acidente

            Empresas mineradoras doaram ao menos R$ 6,6 milhões às campanhas de deputados federais que tratam diretamente do novo Código de Mineração e aos parlamentares da comissão externa da Câmara criada para monitorar os efeitos do rompimento das barragens da Samarco no município de Mariana, em Minas.(…)
Na recém-criada comissão especial para discutir o Código de Mineração, 11 dos 20 parlamentares já indicados receberam R$ 3,39 milhões. (…)
            A Vale, controladora da Samarco com a BHP, doou R$ 4,2 milhões a deputados, segundo o Estadão Dados. A reportagem só contabilizou empresas que trabalham com mineração em seus grupos. (…)
O líder de doações é justamente o relator do texto que propõe novas regras para o setor, deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG). Ele recebeu R$ 1,4 milhão em doações diretas e indiretas. (…)

O Estado de S. Paulo, 15/11/2015

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DESASTRE AMBIENTAL

            O acidente em mariana O rompimento da barragem do Fundão em Mariana (MG), no dia 5 de novembro de 2015, causou o maior desastre ambiental já registrado no Brasil. O “tsunami” de lama, formado de 50 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro, matou 17 pessoas e deixou outras duas desaparecidas.

            O impacto O distrito de Bento Rodrigues, o mais próximo à barragem, foi quase totalmente destruído pela lama. Em todo o trajeto dos rejeitos, que percorreram mais de 600 quilômetros pelo Rio Doce, pessoas perderam suas casas, houve destruição de estruturas públicas, de áreas agrícolas e de preservação ambiental, morte de espécies da fauna e da flora, interrupção do abastecimento de água e de energia, da pesca e do turismo.

SAMARCO A responsável pela barragem é a mineradora Samarco, que é controlada pela brasileira Vale a pela anglo-australiana BHP Billiton. A empresa foi acusada de negligência e omissão pelo Ministério Público, que abriu um inquérito para investigar em detalhes as causas do acidente. Órgãos de fiscalização do governo também têm sua parcela de responsabilidade, já que permitiram que a barragem fosse construída sem um projeto final, além de não terem acompanhado o funcionamento de Fundão como deveriam.

PUNIÇÕES A Samarco foi multada em 250 milhões de reais pelo Ibama. A empresa ainda se comprometeu a fazer um aporte de 4,4 bilhões de reais nos próximos três anos para reparar os danos provocados pelo desastre. A mineradora também teve de pagar indenizações às famílias afetadas – o montante final está sendo negociado.

LEGISLAÇÃO A legislação específica do setor ainda não está totalmente regulamentada. O rompimento de Fundão reacendeu o debate sobre o novo Código de Mineração, que tramita no Congresso desde 2013. Depois do desastre, 28 emendas foram feitas no projeto para torná-lo mais adequado aos riscos da atividade. Ainda não há data para a votação.

Desastre em Mariana (MG): As questões levantadas e as consequências do rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana (MG)
Estudo
Desastre em Mariana (MG): As questões levantadas e as consequências do rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana (MG)
               Devastação O distrito de Bento Rodrigues (MG) ficou coberto com a lama liberada após o rompimento da barragem A lama e seu rastro de destruição O rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana levanta questões urgentes sobre como os crimes ambientais são punidos         […]

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